Por Rafael Giórni Santos
As margens da importante rodovia federal BR-494, encontramos o distrito de Marilândia, que está localizado geograficamente na latitude de 20° 21’ 45’’ S e na longitudes de 44° 55’ 44’’ O. Situando-se na região Centro-Oeste de Minas Marilândia possui uma população de 1.550 habitantes, segundo o Censo do IBGE de 2010.
Marilândia situa-se em um planalto a 800 metros ao nível do mar, onde a sua topografia apresenta níveis que variam de 712 metros de altitude, na Foz do Córrego dos Narcisos até 850 metros de altitude no ponto culminante localizado na Pedra de Marilândia, próximo à área urbana de Marilândia, separando metaforicamente o Rio Itapecerica do Ribeirão Boa Vista, formando assim um interflúvio.
O clima de Marilândia é tropical, com o verão quente e chuvoso, além de um inverno frio e seco. A vegetação de Marilândia se encontra no domínio de Mares de Morros, apresentando uma faixa de transição do Cerrado e Mata Atlântica. Encontramos também outros quatro tipos de cobertura vegetal: campos, plantações de eucaliptos e pastagens.
O formato de uma bacia hidrográfica é parecido com a forma de uma folha de árvore: a nervura central corresponde ao rio principal e as secundárias podem ser comparadas aos rios menores; como os afluentes ou tributários. A hidrografia de Marilândia possui um conjunto de córregos, riachos, ribeirões, que fazem parte da sub bacia do Ribeirão Boa Vista e Rio Itapecerica, que deságuam na bacia do Rio Pará, afluente do Rio São Francisco, incorporando-se assim na bacia hidrográfica do nosso Velho Chico.
O distrito de Marilândia tinha primitivamente o nome de Desterro, em uma alusão a padroeira da terra, Nossa Senhora do Desterro. O nome Marilândia só passou a ser adotado na metade do século XX. O topônimo Marilândia significa “Terra de Maria”: Mari = Maria e Lândia = terra, de onde resultou o nome Marilândia.
Próximo a Marilândia, encontramos vários povoados e comunidades cuja a população depende do distrito para realizar compras e vendas no comércio desta região do município de Itapecerica, entre elas podemos destacar as seguintes povoações: a comunidade de Bom Sucesso, onde encontramos o antigo caminho que passava a linha ferroviária que partia das estações de Itapecerica e Lamounier, além da bela ermida de São Sebastião; Lavrinha e a igreja de Nossa Senhora Aparecida, Sabarazinho comunidade que fica as margens da rodovia MG 260, se encontrando aí um estabelecimento comercial e a igreja de Nossa Senhora Aparecida; Areado e a igrejinha de Santa Rita e Macedo com a formosa igreja de São Judas Tadeu. Por último, cito a comunidade Gonçalves Ferreira, situada a uma altitude de 714 metros, próximo à divisa dos municípios de Itapecerica e Cláudio. Gonçalves Ferreira recebeu a alcunha de “o mais belo jardim do Oeste”, após a construção da sua ferrovia em 1890 e de seu funcionamento a partir de 1912, que partiam da cidade de Cláudio e na década de 1960 também recebia a linha do Paraopeba, Divinópolis/Lavras. Atualmente Gonçalves Ferreira conta, além da sua estação ferroviária (que se encontra abandonada desde 1967), com treze construções de casas em um estilo clássico e a sua majestosa igreja de Nossa Senhora das Mercês.
Segundo o livro “Memorial do Desterro” do escritor nascido em Marilândia, o Sr. Lázaro Barreto; até meados do Século XVIII, Marilândia era considerada uma Sesmaria. Entretanto a partir de 1775, no antigo Arraial do Desterro (hoje Marilândia), um fazendeiro, dono das terras, ordenou que os seus escravos erguessem um templo religioso no alto da colina, e que esse local de orações fosse dedicado a Nossa Senhora do Desterro. A construção da igreja deu início ao maciço povoamento do antigo Arraial do Desterro e por muitos anos o templo de oração e de louvores a Nossa Senhora do Desterro foi uma propriedade particular, privada e provida por este fazendeiro, até ser doada no Século XIX a diocese local da época. Após terem se passado mais de trezentos anos, a Igreja é considerada hoje a mais antiga da região Oeste de Minas Gerais e atualmente o Santuário de Nossa Senhora do Desterro é considerado um dos templos religiosos mais antigos do estado de Minas Gerais.
A construção da igreja se deu graças a doação do português Manuel Carvalho da Silva de cento e quarenta alqueires de terras, onde se constituiu uma capela e logo após a igreja foi erguida. Há relatos de que o próprio Manuel Carvalho da Silva teria sido o principal financiador das obras de construção da igreja, não poupando recursos próprios; visto ao fato da igreja ter sido construída em frente à fazenda onde era a sua residência. No interior deste templo religioso, podemos encontrar algumas relíquias do passado que resistiram ao decorrer de vários anos ou séculos, como os belos altares que preservam o estilo da época com esculturas do barroco mineiro, com as imagens da milagrosa Nossa Senhora do Desterro, Nossa Senhora de Santana, São Francisco, São Geraldo, Nossa Senhora das Dores e a Sagrada família. Também podemos destacar a pia batismal em pedra e sabão e o belíssimo presépio que é montado pela passagem do natal.
Durante as primeiras semanas do mês de julho, a tranquila Paróquia de Marilândia transforma-se em uma festiva povoação. O Santuário de Nossa Senhora do Desterro recebe milhares de peregrinos e fiéis que vêm de várias cidades vizinhas como Itapecerica, Divinópolis, São Sebastião do Oeste, Carmo da Mata, Cláudio, Oliveira entre outros municípios da região, para professar a sua fé, deixando Marilândia cheia de alegria e vida durante os dia de festividades a Nossa Senhora do Desterro. O número de peregrinos aumenta a cada ano, devido ao testemunho de diversos relatos de devotos que atribuem milagres a Nossa Senhora do Desterro, através da Novena Poderosa a Nossa Senhora do Desterro. Entre estes milagres, são citados: a cura de doenças, vista recuperada, pais, filhos e parentes perdidos reencontrados, graças alcançadas, solução de graves problemas e até o afastamento da realização de pressentimentos ruins contidos em pesadelos, onde sem falar nada a ninguém sobre o pesadelo, reza-se a oração e, para afastar a realização deste sonho ruim pensa-se nele e diz a palavra: “Desterrai”. E a partir daí, esqueça o pesadelo e não fale nada a ninguém.
Porém, engana-se quem pensa que o caminho da fé de Itapecerica a Marilândia só é percorrido durante os dias da festa de Nossa Senhora do Desterro, pois o caminho e a trilha que levam ao Santuário é percorrido por devotos, cavaleiros, motociclistas e ciclistas durante o ano inteiro. O trajeto do caminho da fé de Itapecerica a Marilândia é de aproximadamente trinta e cinco quilômetros, podendo variar a distância pelas variações que o trajeto apresenta.
Segundo a Enciclopédia dos Municípios Brasileiros, vol. XXVI, IBGE, 1957; ao final do século XIX, mais precisamente em 1880, foi aberta a antiga Estrada de Ferro Oeste de Minas (EFOM). Ao longo desta ferrovia, na data de 18/09/1890 foi inaugurada a estação ferroviária de Desterro, localizada próximo à divisa com o município de Cláudio, às margens de um lago a 708 metros de altitude. Atualmente a estação de Desterro em Marilândia encontra-se abandonada. Mas, há um projeto para implantar o Trem Turístico na região do Vale do Itapecerica, onde consta a reforma da estação de Desterro e de outras estações que fazem parte do trajeto, que passa pelos municípios de Itapecerica, Divinópolis e Carmo da Mata.
Desde o ano de 2005, guardo na memória as vezes em que percorri (muitas vezes de bicicleta) o caminho da fé que leva os itapecericanos ao Santuário de Nossa Senhora do Desterro em Marilândia. No Caminho da Fé, há diversas trilhas alternativas até Marilândia, com estradas bem conservadas, onde passamos ora por debaixo das sombras de árvores ou debaixo do Sol quente mesmo.
Em 14 de Março de 2005, foi a primeira vez que eu lecionei aulas de Geografia na Escola Estadual Carmelo Mesquita em Marilândia, e além do ano de 2005, trabalhei por mais sete oportunidades nos anos de 2006, 2007, 2013, 2017, 2018, 2019 e 2021. A Escola Estadual Carmelo Mesquita sempre significou muito pra mim, por ter sido a primeira escola onde trabalhei durante um ano inteiro, o que me traz queridas recordações.
Aulas, excursões, colegas de trabalho, alunos, projetos pedagógicos, lições, repreensões, elogios, formaturas, alegrias, tristezas, entre as várias lembranças que vem a minha mente quando falo da Escola Estadual Carmelo Mesquita. Se eu fosse escrever todos os momentos marcantes que vivi como professor nesta querida instituição de ensino, não caberiam talvez em um livro. Entretanto o ápice, veio no ano de 2019, através de uma prática pedagógica de Análise Combinatória do IBGE Educa, com os alunos do 6°Ano do Ensino Fundamental da Escola Estadual Carmelo Mesquita em que todos os alunos tiveram êxito, não apenas aos olhos da comunidade, mas a nível nacional, após o trabalho Vestindo a Bia e o Rafa, realizado por eles, ser selecionado entre os 200 primeiros de todo o Brasil.
Para terminar este texto, eu me lembro que anos atrás, nas minhas horas de folga na Escola Estadual Carmelo Mesquita, sempre caminhava sozinho pelas ruas em Marilândia e encontrava uma senhora quieta e calada, bordando retalhos de panos, cuja sua única dedicação era o seu ofício artesanal. Os anos se passaram e hoje quando passo por lá, percebi que os encontros não se repetem, pois toda a nossa existência vai tomando outros ares, sem que nenhum de nós ou quase saiba como Marilândia passou por tamanha transformação desde a sua fundação. Mas toda a história dessa mudança poderá ser apagada pela borracha do esquecimento; a não ser que cada um de nós, amantes do velho Arraial do Desterro façamos igual a esta senhora quieta e calada, nos dedicando as nossas “memórias em retalhos”.
*Texto extraído do Livro 17 Histórias Marcantes de Marilândia (2022), publicado pela editora Patrimônio das Letras.
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